sexta-feira, 17 de agosto de 2018


GAÚCHO DE APARTAMENTO

                                                                                                    Krretta

Bah, então tavam os dois magrinhos do Bonfa no Acampamento da Harmonia, curtindo as coisas do campo, quando chegou um outro gaúcho, só que caprichado nas pilchas, tapeou o seu aba larga, apeou de um “upa” do cavalo, um zaino apurado e de cola atada, donde se destacava a lindeza das encilhas, e tilintando as chilenas, maneou o seu pingo.
Mais do que ligeiro, um magrinho olhou para o outro, e disse:
- Bah cara, seguinte, sente só: a pinta algemou o horse”!
(Crédito – Betinho Griguc)
-:-

         Essa piada foi contada no programa Aperitivo de sábado passado, para ilustrar uma situação que suscitei, e que considero-a bastante repulsiva, principalmente quando estamos nos aproximando da Semana Farroupilha, onde digo que todos nós somos gaúchos, em qualquer lugar.
         Pois roda pelas redes sociais, em textos e fotos, dezenas de publicações de tom certamente duvidoso, onde criticam de forma bastante irônica “os gaúchos de apartamento”, ou de “Semana Farroupilha”.
         Falam abertamente das pessoas que não participam, pelas mais diversas razões, da vida do campo, mas que, galhardamente, gostam de festejar a data magna deste Estado.
         Eles esperam um ano inteiro para vestirem sim, suas pilchas, seja no trabalho, na escola, nas ruas ou aonde for, e são sim gaúchos legítimos, autênticos, como toda e qualquer outra pessoa nascida aqui neste Estado.
         Chega deste preconceito idiota e antipático, onde só quem vive diariamente tratando das lides de campo, seja por profissão ou por esporte, que são os verdadeiros gaúchos.
         E muito mais do que isso, saibam todas estas pessoas que vivemos num país que prega a liberdade, e se somos livres, portanto nasce da nossa vontade toda e qualquer manifestação de amor as nossas tradições, seja por A ou B, e se são legítimas, são verdadeiras, seja gaúcho do campo ou da cidade, do galpão ou de apartamento, dos Centros Nativistas ou só da Semana Farroupilha.
         Esse ranço inepto, néscio, desprovido de qualquer outro senso que não seja o de se achar o “dono da razão”, esse fanatismo descabido de se achar “por cima da carne seca”, semeia mágoa, repulsa e tantos outros sentimentos de ojeriza, que em nada ajudam na causa.
         Ao contrário, afastam cada vez mais as pessoas que só querem festejar um momento nobre e glorificar a sua história, que é tão bonita, e que só querem vestir as suas pilchas e demonstrar o orgulho que sentem pelo seu Estado, mas que começam a se afastar deste movimento, e ainda mais, passam a sentir repulsa, por estas atitudes ignóbeis.
         Não seria mais fraterno acolhê-los com alegria, com satisfação, fazê-los se sentirem “em casa”?
         O gaúcho, por tradição, se orgulha da sua hospitalidade, no entanto, com os seus próprios irmãos, ignora totalmente esta hospitalidade, usando e abusando de um tom jocoso e descabido.
         Não, não é isso que queremos.
         Queremos o sentimento do gaúcho que une, que congrega, que abre espaço para um aconchego e se torna protagonista em desvendar novos horizontes aos seus patrícios.
         Mas, infelizmente, parece que não é isso que está acontecendo.
         O dito campeiro, o “sabidão”, por sua autossuficiência, por sua soberba e ignorância, não nota e nem percebe que o gaúcho de apartamento, de Semana Farroupilha quando se pilcha, e humildemente pede a um “tradicionalista” dar um nó em seu lenço, a bem da verdade está reverenciando ele, o campeiro, o tradicionalista, está venerando a cultura através dele, por servir ele, “o sabichão”, de referência.
         Será que é preciso desenhar?
         Já passou da hora de terminar com esse azedume, com esse mofo, com essa rancidez.
         Pior de tudo que este sentimento já afastou muita gente dos centros de tradições, das semanas farroupilhas, dos rodeios e muitas outras atividades gauchescas.
         Infelizmente.
         O homem do campo, aquele que cria gado, que cura “bicheira”, que para rodeio, que laça e gineteia, que empertigado nos CTGs dança a Chimarrita e o Chamamé Figurado. . . pode ficar tranquilo e sossegado.
Pois que lhe garanto, não vai ficar menos campeiro, menos laçador, menos ginete ou dançarino porque o gaúcho de apartamento, de Semana Farroupilha, e da cidade o faz de referência, cultuando-o ao vestir bombacha, bota e ao estampar, orgulhoso, um lenço no pescoço!!
“Liberdade, Igualdade e Humanidade”, simples assim.
        
          

           
           

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