CHEIRO DE VÓ
Krretta
Nestes dias de quarentena, de algumas
reflexões e muitas lembranças, nos dão a dimensão de que realmente o tempo é
impiedoso na sua trajetória.
Verdadeiramente, o tempo não para, mas,
nos dá a chance de lembrarmos das boas saudades.
Quantos, assim como eu e, por esses dias, estão sentindo
estas saudades?
Estamos vivendo um tempo (reclusos) em
que estas recordações ficam mais latentes, e nos remetem com muita felicidade
ao passado.
Viajar nestas lembranças fazem com que
nos sintamos mais próximos das pessoas queridas que já habitam outras esferas,
outros mundos, mas, mesmo assim, por longos e alegres momentos estão junto
conosco.
Tenho especial carinho por estes
pequenos encontros.
É o que nos resta enquanto não temos a
dimensão de tudo o que ocorre a nossa volta, ou, por outra, estamos com medo.
“A morte não é a nossa perda maior.
Nossa perda maior é o que morre dentro de nós enquanto vivemos.” - Norman
Cousins – jornalista
Por isso é que convivemos mais
alegremente entre estas maravilhosas recordações, porque sentimos que nos fazem
bem.
Nos fazem ter a certeza de que, embora
as dificuldades que passamos, tivemos momentos intensos e felizes junto de
nossas pessoas queridas, estimadas e veneradas, lá na nossa infância.
Todas estas reminiscências são
lenitivos para a alma e o coração.
Traz calma, ternura, amor aos nossos
dias.
Somos gratos por isso.
Principalmente porque tivemos a Casa da
Vó.
A Casa da Vó era uma casa cheia.
Cheia de amor, cheia de carinho, cheia
de afeto, cheia de pessoas alegres e de muita amizade.
A Casa da Vó tinha galinha no terreiro,
tinha horta no quintal, tinha flores nos jardins, a Casa da Vó tinha batata
frita na volta do fogão antes do almoço, tinha a novela O Direito de Nascer no
rádio valvulado Zenith...
...cafuné no colo macio e terno, tinha
mesa cheia e muita algazarra, encontro de primos, as “artes” aprontadas, tinha
banho de tanque no verão, uma parreira cheia de cachos de uva preta e muito
doces, tinha pereira e pessegueiro, e um butiazeiro que certa feita me levou ao
hospital depois de comer um cacho inteiro.
Tinha todos os dias o aroma e o café da
tarde, junto com as filhas e os netos, e a caderneta do armazém do seu
Orozimbo, para comprar balas e pirulitos...para nós...
A Casa da Vó tinha uma poltrona grande,
de cor de abóbora que era o trono da matriarca, e que num tempo passado foi a
casamata e o descanso do vô Marcínio, quando por incontáveis vezes sentei com
ele para fazer palavras cruzadas do Correio do Povo.
Sei lá, mas acho que foi daí que tomei
gosto pelas “escritas”...
A Casa da Vó tinha a Nena, sua irmã
solteira e nossa tia-avó, que era a administradora geral daquele refúgio
encantado, daquele castelo enfeitiçado pela magia do amor, com sua imensa bondade,
sua paciência, seu carinho e sua dedicação a toda a família.
A caderneta do armazém? Era ela quem
liberava! Viva a Nena!
Que saudade da Neninha.
A Casa da Vó tinha o seu cheiro.
Cheiro de Vó.
Esta peculiaridade ímpar que ficou
gravado numa memória distante dos saudosos cheiros da infância.
Meu pai, o Chico, gostava muito do
cheiro das flores de jasmim.
Costumo dizer que todas as vezes que
sinto este cheiro no ar, o seu Carreta está do meu lado; desceu para conversar
e me aconselhar...
Por muitas vezes sinto o cheiro de Vó.
Na fritura das batatas, nas flores de
algum jardim, nas parreiras tomadas pelos cachos de uvas pretas, em um café da
tarde, num verão e um tanque cheio...
A Vó Marieta tinha cheiro de talco, de
maçãs e alfazemas, cheiro do perfume do amor, do carinho, a Vó Marieta tinha
cheiro da ternura...
...tinha o cheiro divino de Deus.
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